terça-feira, 29 de janeiro de 2013

há dias que silenciam as gotas...

"O presente não é um passado em potência, ele é o momento da escolha e da acção." 

(Simone de Beauvoir)


Há já algum tempo que não me tenho a escrever. Vejo-me quase sempre espantada com o mundo, admirada com o passar do tempo, voltada para dentro de mim. 

Há já algum tempo que adivinho as dores que cruzam os dias...nem todos os dias, mas especialmente aqueles em que nos vivemos iguais, abraçamos iguais, amamos diferentes.

Há já algum tempo que a chuva não corria como agora...a tal modo,  que me atrevo a explicar, acreditasse eu em celestiais acontecimentos, a dor dos anjos, as lágrimas dos condenados, a saudade de todos a quem já se destinou à eternidade.

Mas há dias que silenciam as gotas... 

Silenciam-se devagar...e o sol rompe com a melancolia dos dias à chuva e atira-me contra a dureza das paredes erguidas a partir do quotidiano de todos os que arrastam a vida, a partir do suor do corpo. Contam-se as gotas uma a uma. As estórias que surgem aos molhos, as agruras que caiam sobre o chão húmido e se enterram na lama seca.

"O meu filho...nem sempre foi assim." Que houve alturas em que estaria por  se definir. Que a escolha teria sido sua. Que não sabia se havia escolhido o melhor.

E abriram-se as fontes do coração...e correram as lágrimas de quem chove por dentro segredos guardados na vida da alma. 

Contive a respiração e aguardei a continuação...como quando nos contam a profanação um acto. Único. Decisivo. Abafado.

"Nasceu rapaz e rapariga, nasceu e era os dois. Escolhi um...nem sei se escolhi bem. Acho que deveria ter esperado."

E o passado fundiu-se com o presente, o futuro assumiu contornos macabros e a ansiedade matava as horas de incómodos mil... 

Sossegaram-se-me as palavras e o som gritou abafado a dor de uma mãe desfeita em chuva que atirada para o outro lado, pesa o que pesa, mede o que mede.

O abraço dei-lho no meu silêncio...o resto, guardo-o para mim. Aqui partilho a dor primeira. A reflexão da escolha. O passado, presente e futuro, na água em forma de dor, na lágrima da gota de chuva, espelhada no coração de mãe.





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